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DAVI

Enquanto Saul ainda vivia e governava como rei, um homem segundo o coração do próprio Deus estava sendo conduzido à liderança, sem nenhum plano ou vontade próprios (1Sm 13.14). Samuel foi enviado para escolher Davi entre todos os filhos de Jessé (16.13) e o ungiu rei no lugar de Saul. O Espírito do Senhor veio sobre Davi, mas abandonou Saul (16.13,14). O papel do juiz-salvador jamais se mostrou com tanta clareza como quando o jovem Davi, capacitado pelo Espírito, matou Golias (1Sm 17). Nesse fato fica evidente que o juizado salvífico é o precursor da monarquia salvífica que está surgindo. Enquanto todo o Israel recua aterrorizado diante dos filisteus e de seu herói, o rei ungido de Deus, de aparência fraca e insignificante, luta por seu povo sabendo que a batalha é do Senhor (17.45- 47). Davi resiste sozinho como um no lugar de muitos, e, por seu intermédio, Deus opera a salvação para Israel.

É compreensível que Davi seja celebrado pela nação. A inveja de Saul cresce a ponto de seu único desejo ser matar Davi. Rejeitado e desprezado, Davi foge da sociedade e reúne em torno de si um bando de desajustados. Contudo, é tão forte em Davi a consciência de que o rei é ungido por Deus que ele se recusa, pelo menos em duas ocasiões, a levantar a mão contra Saul. Ele está disposto a deixar que o Senhor retire o seu ungido do cargo (1Sm 24.1-7; 26.6-12). Do mesmo modo, no tempo de Deus, Davi será vindicado aos olhos do povo e elevado ao trono. A sanidade de Saul e o domínio do reino lhe escapam, e ele morre em batalha contra os filisteus no monte Gilboa (1Sm 31).

A transição do reinado de Saul para o de Davi não é particularmente tranquila. Não obstante, Davi é logo proclamado rei, aos trinta anos de idade. Por ordem do Senhor, ele inicia uma campanha exitosa contra os filisteus e protege as fronteiras de Israel. Também retoma a fortaleza de Jerusalém dos jebuseus e a transforma em capital (2Sm 5). Ele traz a Arca da Aliança para Jerusalém (2Sm 6) e decide construir um santuário permanente para ela (7.1-3). Contudo, o profeta Natã leva-lhe a palavra do Senhor proibindo-o de construir o templo.

A aliança de Deus com Davi é da máxima importância para entender a teologia que envolve esse rei, que é o mais notável de todos. Deus prometeu engrandecer o nome de Davi e dar ao seu povo descanso em sua terra. Não permitiu que Davi lhe construísse uma casa (um templo), mas afirmou que ele mesmo edificaria para Davi uma casa (uma dinastia). Davi teria um filho que de fato construiria o templo e cujo trono se estabeleceria para sempre (7.4-12). A continuidade dessa aliança com a aliança firmada com Abraão pode ser observada em seus respectivos resumos. A frase “Serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo” resume o propósito de Deus na aliança com Abraão e, depois deste, com Israel (Gn 17.7,8; 26.12; Jr 7.23; 11.4; 30.22). Agora a promessa a respeito do filho de Davi, aquele que representará todos os outros, é dada do seguinte modo: “Eu serei seu pai, e ele será meu filho…” (2Sm 7.14). Por isso, o filho de Davi também é o filho de Deus, e a sua casa, o seu trono e o seu reino serão estabelecidos para sempre (7.16).

Muito tempo depois de sua morte, Davi ainda é exaltado por essa relação com a aliança. No salmo 89 (veja também salmo 132) é possível encontrar um exemplo disso. O salmista começa exaltando a Deus por seu amor aliancístico (hebraico: hesed) e sua fidelidade estabelecidos para sempre (v. 1 e 2). Toda a esperança de Israel agora se concentra nas profecias de Natã a Davi (2Sm 7). Com efeito, a aliança com Davi é retratada como a mais importante de todas as promessas de Deus: Fiz uma aliança com meu escolhido;

jurei ao meu servo Davi: estabelecerei tua descendência para sempre e firmarei teu trono por todas as gerações (Sl 89.3,4).

Em seguida há uma aparente intromissão, quando o salmista vai a regiões celestiais em que Deus é louvado por todas as criaturas e pelos exércitos de seres angelicais. De lá, Deus exerce o seu reinado no mundo, controlando a natureza e demonstrando graça para o seu povo (89.5-18). Isso, porém, não é nenhuma intromissão, pois esse reinado glorioso de Deus deve ser representado na terra pelo reinado de Davi e seus descendentes. A aliança com Davi inclui todas as promessas anteriores da aliança. O salmista diz a respeito de Deus: A retidão e a justiça são os alicerces do teu trono; o amor e a fidelidade (hesed) vão à tua frente (Sl 89.14, NVI). E sobre o filho de Davi, ele diz:

Minha fidelidade e meu amor (hesed), porém, estarão com ele, e em meu nome o seu poder será exaltado (89.24).

A aliança é tanto condicional quanto incondicional: Se seus descendentes abandonarem minha lei […]

castigarei sua transgressão com vara, e seu pecado, com açoites. Mas dele não retirarei todo o meu amor (hesed), nem faltarei com minha fidelidade. Não violarei minha aliança, nem alterarei o que saiu de meus lábios (89.30,32-34).

Já vimos que esse princípio condicional/incondicional atuou quando uma geração inteira do povo escolhido morreu no deserto por causa de seus pecados, mas uma nova geração continuou sob a promessa. Veremos o princípio se repetir mais de uma vez futuramente. Ele significa apenas que a infidelidade do povo da aliança atrai o juízo de Deus, mas nunca pode anular a fidelidade da aliança (hesed) de Deus. De algum modo, dentre o povo infiel da aliança, sempre surge uma parte, um remanescente, que é fiel porque Deus é fiel.

• Davi recebe promessas de Deus que resumem todas as promessas anteriores da aliança e se concentram na linhagem de descendentes davídicos.

—- Retirado de Graeme Goldsworthy – Introdução à teologia bíblica

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