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A Antipolítica de Jesus

A Antipolítica de Jesus

Quando analisamos os discursos de Jesus, vemos que Ele tinha uma mensagem bastante política. Porém, de oposição à política.
Em todo o seu período de pregação e ensino, Jesus não forneceu esclarecimentos sobre questões específicas da política, muito menos um modelo político ou apoio político a qualquer vertente. O que Ele ofereceu foi uma contradição muito profunda entre o que é viver pela fé e os valores deste mundo. Até mesmo quando perguntavam diretamente sobre questões políticas, Jesus encontrava uma maneira de tratar dos assuntos que realmente importavam.

Quando perguntaram a Ele se era certo os judeus serem obrigados a pagar imposto ao Império Romano, numa pegadinha maliciosa, Jesus confrontou os seus corações. Primeiro, Jesus disse que o dinheiro já era do imperador – e de fato era, pois tratava-se de um serviço, o uso do dinheiro, prestado pelo império sob o custo do seu uso. Então, “dai a César o que é de César”. Depois, Jesus disse o que os questionadores não queriam ouvir: “dai a Deus o que é de Deus”.

Quando perguntaram a Jesus se eles eram obrigados por lei a pagar imposto a César, os fariseus estavam tentando pendurá-lo nas cordas do dilema político da sobretaxa. Os judeus viviam oprimidos e indignados porque a terra prometida estava sendo governada por romanos pagãos. Pagar imposto a Roma era uma ofensa religiosa, porém não pagá-lo era um ato suicida. […] Este é o desejo de Jesus: devemos entender que o perigo enfrentado por nossa alma corre por causa dos governos injustos e seculares não pode ser jamais comparado com a magnitude do perigo que ela enfrenta diante do orgulho insubmisso. Nenhum abuso de autoridade da parte de César e nenhuma lei injusta de Roma tinha poder de lançar alguém no inferno. Já o orgulho e a rebeldia levam para o inferno todo aquele que não tem um Salvador. (PIPER, ibidem, p. 358, 362).

Por isso, os cristãos, biblicamente, são chamados para serem ateus políticos. Segundo os preceitos da Palavra, cristãos não acreditam que nenhum projeto terreno conseguirá construir uma nação santa, trazendo o reino de Deus.
Alguém agora pode perguntar: então nós não precisamos fazer a diferença neste mundo? Não temos nada a oferecer à cultura?
Onde fica o nosso mandato cultural?

O Mandato Cultural

Em alguns círculos cristãos, ouvimos muito sobre o mandato cultural do cristão. E há muita confusão sobre isso na prática.
O mandato cultural tem a ver com a vice-regência (ou a administração) do homem sobre a criação. O homem, quando foi criado, devia desenvolver e manter tudo aquilo que fora criado por Deus. Através dessa responsabilidade, Deus estava colocando a humanidade em um relacionamento singular com a criação, para dominar e sujeitar (Gn 1:28), guardar e cultivar (Gn 2:17).

É isso que justifica o trabalho e o envolvimento do cristão em áreas como: educação, artes, lazer, tecnologia, indústria e quaisquer outras. Isso é reforçado pelo apóstolo Paulo desta forma: “Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens, cientes de que recebereis do Senhor a recompensa da herança. A Cristo, o Senhor, é que estais servindo” (Cl 3:23-24).
Pois bem, sabe o que o mandato cultural não diz?

Pasme: ele não diz nada a respeito de pessoas dominando umas às outras. Dominar e sujeitar é função da humanidade para com o restante da criação, não de um grupo de pessoas especiais acima das demais. As ordens em Gênesis são claras: a humanidade deve gerenciar o restante da criação, não escravizar ela própria.

A nossa função como cristãos não é dominar a sociedade. Viver como cristãos neste mundo não é impor pela via política uma cultura cristã. A vida cristã, na prática, tem a ver com o que fazemos em prol do convencimento, não da obrigação. Nós trabalhamos com persuasão, não com opressão.
Podemos, sim, e devemos servir a sociedade para que o bem seja promovido. Porém, não exigindo que os nossos valores sejam adotados, e sim que eles sejam percebidos e entendidos.
A fé em prática é o serviço, não a manipulação do próximo.

Cristãos, segundo as Escrituras, devem, isto sim, apontar e sinalizar para o bem, caminhar em direção ao que é bom, testemunhar o que Cristo fez pela humanidade. A nossa missão está no anúncio. A nossa confiança jamais deve estar em coisas que nós podemos produzir com o nosso esforço ou estratagemas. No reino de Deus, Ele mesmo é o arquiteto e o construtor. Ele projetou e ele é o executor. Nós apenas o recebemos de cima para baixo.

O maior reflexo público da fé, o testemunho da transformação operada em nós pelo Espírito Santo, é a empatia, a preocupação real e sincera com o próximo.

Ser cidadão cristão é se ater àquilo que Jesus ensinou: “Assim, em tudo, façam aos outros o que vocês querem que eles lhes façam; pois esta é a Lei e os Profetas” (Mt 7:12).

Por Que Não Admitimos?

O que dissemos neste capítulo até aqui é o que todo cristão já sabe. Mesmo assim, na prática, é extremamente comum vermos cristãos por toda a parte engajados em campanhas políticas de vereadores e deputados também cristãos, na expectativa de que essas pessoas salvem o país proibindo o pecado à base de leis.

Mas o nosso papel na sociedade como cristãos não é votar em candidatos que impeçam o pecado. Por que não admitimos isso?
Por que é tão difícil deixar para trás a vontade de dominar o próximo? Isso, todos sabemos, tem um nome: autoritarismo.
Quando cristãos tentam usar o estado para impedir que outras pessoas façam o que elas não gostam, seja com a desculpa que for, isso é fruto de uma mentalidade imatura e autoritária.
A nossa luta é pela conversão das pessoas. A nossa militância é para que as pessoas conheçam o Evangelho, compreendam que estão em pecado contra Deus, se arrependam e confiem em Jesus.

A nossa missão, de forma nenhuma, é proibir as pessoas de pecar. Muito menos usando a força estatal.

Nem mesmo Deus faz isso conosco! Ainda assim, alguns cristãos são tão santos, tão santos, acima até da santidade do Espírito que inspirou a Palavra, que se sentem no direito de ditar como deve ser a vida das outras pessoas.
Para exemplificar, pense no seguinte: e se a inveja, a arrogância, a cobiça e a fofoca, sua e dos seus familiares, também fossem punidas pelo estado com prisão?

Cristianizar a política e a força estatal das leis não cabem na proposta de vida que o chamado do Evangelho oferece.
É compreensível que você esteja confuso, pois deve ter passado um bom tempo de sua vida convicto de que os cristãos têm a responsabilidade moral de consertar a sociedade, mesmo nunca tendo lido isso em parte alguma das Escrituras.

Nós devemos, sim, nos preocupar com a atuação de pessoas más na sociedade que prejudicam outras pessoas. Mas a forma de se fazer isso não é a via estatal. Como cristãos, não estamos aqui para tentar cristianizar o mundo politicamente. Como cristãos, agimos na sociedade para fornecer meios dignos para a vida das pessoas, para que elas possam correr atrás dos seus próprios propósitos, para que nós também, como igreja, possamos fazer o mesmo, e tentar convencer essas pessoas, pelo Evangelho, de que o propósito delas deve ser seguir a Deus.
Daqui em diante, veremos com mais precisão qual é o tipo de relação que Deus espera do cristão com a sociedade e como nós devemos pensar na política.

Leia muito, mas muito mais sobre isso no livro A Política e a Fé Cristã, no link abaixo:

A Política e a Fé Cristã | Lucas Rosalem

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