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A Teologia do livro de Miquéias

O livro de Miquéias contém três mensagens ou oráculos. Estas três mensagens alternam os fios de esperança e juiço com os quais a aliança de Deus com Israel fora tecida. A primeira mensagem de Miquéias (1.2–2.13) apresenta o juízo vindouro de Deus sobre Israel e Judá. A causa central para a ruína da Samaria fora sua idolatria (v. 7), um pecado que transbordou para Judá (v. 9), e o qual estenderia para lá a destruição a ser provocada contra Samaria. A sucessão das cidades mencionada em 1.8-16 muito se assemelha à rota empregada por exércitos invasores futuros, chegando a Jerusalém pelo sudoeste, através da região montanhosa até à capital. Essa seção revela tanto o tenro coração de Miquéias para com seu povo (v. 1.8) quanto seu senso de humor (usando uma série de trocadilhos envolvendo o nome das cidades e seus destinos durante a futura invasão; cf. 1.10- 12,14,15).

A segunda parte da primeira mensagem dá uma lista dos muitos motivos pelos quais o reino de Judá seria punido. Havia claras violações das estipulações da aliança mosaica. Os primeiros cinco versículos denunciam ganância nacional, um espírito de perverso materialismo que levou os poucos que possuíam terras a usar de astúcia e dolo para acrescentar ainda mais à riqueza mal adquirida. A punição para isso seria a divisão de seu patrimônio entre invasores estrangeiros zombadores. Miquéias, começando com o versículo 6, denuncia a nação por sua má vontade em ouvir os verdadeiros profetas e sua avidez em seguir aqueles cuja motivação eram as bebidas inebriantes, em vez do Espírito divino. Mesmo esse duro retrato de uma nação que se engana e destrói a si mesma, porém, contém um raio de esperança no qual o Senhor promete uma restauração completa tanto do povo quanto da terra sob a liderança do ץֵ ר ֹפַּה ) p pōrēṣ) ―aquele que abre o caminho‖, uma figura para o Messias que é novamente usada pelo profeta no capítulo 5. A segunda mensagem (3.1–5.15) também tece os fios de juízo e livramento. O capítulo 3 contém uma cáustica denúncia contra a ganância nacional, na qual cidadãos que subiam socialmente são igualados a carniceiros em sua cruel e sistemática exploração da classe plebéia. Especialmente destacados por seus oportunismo e uso mercenário de seu cargo são os profetas, que tiravam vantagem do seu papel para lucrar fraudulentamente, ajustando suas mensagens de bênção ou maldição à quantidade de dinheiro a ser derivada delas (3.5-7). A nota pessoal em Miquéias 3.8 sugere que ele também sofria oposição da organização religiosa de Israel. Aos líderes hipócritas que pervertiam a justiça na esperança de que o templo faria Sião inexpugnável (3.9-11), Miquéias prometeu a total destruição tanto da cidade quanto do templo (3.12), assim como Jeremias faria um século depois. O fio de livramento aparece no capítulo 4, em uma passagem muito debatida que se encontra quase palavra por palavra em Isaías 2.2-4. Visto que os dois profetas são praticamente contemporâneos, é difícil decidir quem citou quem. É bastante concebível que ambos se referiam a material profético existente, fundamentado nos chamados ―cânticos de Sião‖, como os salmos 46, 48 e 76.

O triste retrato de uma Sião devastada dá espaço a uma visão do reino Messiânico, em que Sião é o centro da vida política e religiosa para uma humanidade renovada, que não conhece a ameaça de guerra e cujos plebeus podem pacificamente desfrutar sua terra e seus frutos (4.1-4). Esse primeiro parágrafo termina com uma aplicação de tal esperança para os tempos do próprio Miquéias: Judá andará (ou precisará andar) com o Senhor seu Deus. A promessa de bênção é estendida àqueles que os homens consideram impróprios para a sociedade e cuja dignidade e alegria serão restauradas com as fortunas de Jerusalém (4.6-8). O fio de condenação reaparece em uma predição do cativeiro babilônico (4.9,10), mas o livramento segue atrás rapidamente, pois o profeta prediz também a restauração sob Ciro. O contraponto profético continua com a predição de uma futura união de exércitos gentios contra Jerusalém. Isto pode ser uma referência a um evento contemporâneo (a invasão de Senaqueribe?), ou a um cerco histórico futuro (Babilônia; veja a referência ao golpe contra o juiz de Judá, possivelmente Zedequias, em 5.1), ou a uma invasão escatológica (como é sugerido pelo papel destrutivo de Judá depois de tal invasão, cf. 4.13). É mais provável que todos os três pontos de vista estejam contidos na profecia, de acordo com a maneira costumeira dos profetas condensarem os eventos futuros. O contraste entre condenação e livramento está presente nas referências ao juiz (טֵשפ , šōp ēṭ), vindo de Jerusalém (5.1 [Hb 4.12]), e ao Governante (לֵושֹמ ,môšēl), que sairá de Belém (5.2 [Hb 5.1]) e reunirá Israel depois de seu longo período de dispersão nacional.

O reinado desse Governante será marcado pelo livramento definitivo de Israel de seu inimigo arquetípico (aqui representado pela Assíria, 5.4-6 [Hb 5.3-5]), pelo papel de bênção atribuído a Israel entre as nações (5.7-9 [Hb 5.6-8]) e pela eliminação de todas as outras fontes de confiança e segurança para Israel, a saber, seus exércitos, suas alianças e seus ídolos (5.10-15 [Hb 5.9-14]). A terceira mensagem de Miquéias começa com o fio da condenação (e uma exortação comum a todas as três seções de condenação – a ordem para ouvir (cf. 1.2 e 3.1)). A disputa judicial de Deus com Seu povo é testemunhada pelos elementos da criação: ao lembrar Israel de Sua proteção e bondade no passado, o Senhor acentua a infidelidade da nação (6.1-15). O profeta responde pela nação, perguntando se a religião ritualista exagerada desta bastaria para expiar seus pecados diante de Deus, para o qual a resposta óbvia é: ―NÃO‖. Deus exige nada menos do que conversão nacional a uma vida de conformidade interna a Sua santidade, justiça e amor (e fé expressa por meio de sacrifício [6.6-8]). Continuando Sua disputa, Deus mais uma vez focaliza os pecados específicos de ganância, desonestidade e violência (típicos de Acabe e sua dinastia, e agora encontrados em Judá; cf. 6.9-12,16), que seriam punidos com fome, destruição e humilhação (6.13-16).

A resposta da nação pelos lábios do profeta é de profunda contrição e confissão. Ele lamenta a falta de piedade e a corrupção generalizada (7.1-3) e deplora a falta de solidariedade familiar e social (7.4-6). Contudo, em meio a total escuridão, uma luz de esperança brilha, a própria pessoa de Yahweh, o Deus de Israel, que disciplinará, mas também restaurará, a nação, mesmo em seu estado mais miserável (7.7-10).

O último fio, que amarra toda a profecia, é novamente o fio de livramento, que aqui descreve como Israel será reunido dos seus lugares de exílio (7.11-13). Arrebatado pela visão, o profeta ora pela intervenção pastoral de Deus (7.14) e prevê o papel glorioso do Israel perdoado e restaurado sob o governo de seu Deus perdoador e gracioso, que fará valer Suas promessas verdadeiras aos patriarcas (7.15-20).

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