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O Espírito Santo e a Bíblia

O Espírito Santo e a Bíblia

No catolicismo, o Espírito Santo é irrelevante para a leitura, iluminação, aplicação e testemunho interno, no que se refere à Escritura. No protestantismo, Ele é fundamental; conditio sine qua non para entender a Bíblia e ser beneficiado por ela no cotidiano. Como consequência imediata dessas abordagens, no primeiro caso, o fiel católico sempre interpretará corretamente qualquer texto quando tiver a própria igreja católica como centro e contexto para os textos, sendo impossível divergir da própria igreja, que é quem interpreta corretamente – o povo está dependente do clérigo. Do outro lado, o fiel protestante não depende da igreja, nem do pastor, mas ele mesmo está em contato com Deus através do Espírito Santo, que o auxilia na compreensão do texto.

A fragilidade das interpretações humanas e suas contradições, tanto em questões políticas e sociais quanto em questões doutrinárias, têm sido uma grande demonstração prática, irremediável, contra a abordagem católica. Então, que cada cristão sirva-se com o que quiser.

A Santa Inquisição
A Santa Inquisição

Os católicos, talvez por ingenuidade mais do que por orgulho, consideram a sua Igreja “incapaz de erro”, incapaz de ser “cortada” ou de apostatar. Não consideram aquilo que Paulo diz: “Aquele que está de pé, cuide para que não caia”! – 1Co.10,12. O que o apóstolo alerta já no primeiro século é precisamente o oposto dessa teoria mirabolante dos católicos da “infalibilidade”: eles deveriam é temer serem cortados, pois o Deus que não poupou os ramos naturais também não lhes pouparia. Aliás, não foi Pedro o primeiro papa? Pois bem, como pode o próprio papa não pensar nas coisas de Deus, mas nas dos homens, e mesmo assim ser infalível?! Depois da prisão de Jesus, Pedro negou repetidamente o Senhor Jesus, indo tão longe ao ponto de se amaldiçoar e jurar (Mt.16:69-75).

Anos mais tarde, Pedro continuou a demonstrar a sua falibilidade, quando atuou como hipócrita e foi repreendido na face por Paulo: “Quando, porém, Pedro veio a Antioquia, enfrentei-o face a face, por sua atitude condenável. Pois, antes de chegarem alguns da parte de Tiago, ele comia com os gentios. Quando, porém, eles chegaram, afastou-se e separou-se dos gentios, temendo os que eram da circuncisão. Os demais judeus também se uniram a ele nessa hipocrisia, de modo que até Barnabé se deixou levar. Quando vi que não estavam andando de acordo com a verdade do evangelho, declarei a Pedro, diante de todos: ‘Você é judeu, mas vive como gentio e não como judeu. Portanto, como pode obrigar gentios a viverem como judeus?’” (Gálatas 2:11-14).

Ademais, o próprio Pedro também tinha falhas doutrinárias. Por mais que o Senhor Jesus já tivesse declarado “puro todos os alimentos” (Mc.7:19), Pedro continuava considerando certos alimentos como “impuros e imundos” (At.10:14), precisando ser corrigido em seguida pelo próprio Senhor Jesus através da visão que estava tendo (At.10:15). Ou seja, Pedro tinha falhas morais e tinha falhas doutrinárias. Ele era um ser totalmente falível, isto é, sujeito a falhas em todos os aspectos, assim como qualquer outro homem mortal.

Muito mais poderia ser dito sobre o assunto. Mas parece apenas como bater em cachorro morto. Os amigos católicos que me desculpem, mas apenas leia, por gentileza, o que disseram os reformadores a respeito da interpretação bíblica.

“A Escritura Sagrada que temos conosco não é o resultado de nenhuma interpretação ou especulação humana; é produto da ação do Espírito de Deus sobre seus autores. Eles não tomaram sua própria ideia para interpretar a revelação divina, mas tomaram a revelação divina e, sob a ação do Espírito, registraram o que receberam. Pedro diz que “nenhuma profecia da Escritura provém de particular elucidação”. Literalmente, essa expressão significa: “toda profecia da Escritura não veio à existência por sua própria interpretação”. O verbo grego usado é γίνεται (ginetai), que significa primariamente “vir à existência” ou “tornar-se”. É comum entre os reformados a máxima de que os indivíduos sob a ação iluminadora do Espírito Santo podem entender a Escritura e de que a própria Escritura interpreta-se a si mesma (o princípio da analogia Fidei ou analogia Scripturae). Todavia, o pensamento católico romano é contrário a essas ideias. A igreja católica diz que somente a igreja deve interpretar a Escritura e que ela não pode ser interpretada por indivíduos particulares. Burridge cita um livreto escrito por um romanista que comenta esses versos de Pedro da seguinte forma: “São Pedro dá a razão para derrubar a nossa interpretação particular e reconhece somente a interpretação oficial como guia seguro”. Então, Burridge comenta que “essa visão da igreja de Roma ignora o impacto do verbo que Pedro usa. Ele muda a descrição do apóstolo de como as Escrituras “vieram à existência” para um mandamento sobre o que devemos fazer “com” a Escritura. Isso não é, obviamente, aquilo de que o apóstolo está tratando”. Devemos desprezar totalmente a visão romanista da interpretação da revelação divina. Na verdade, o texto está tratando da interpretação da revelação divina que o profeta tinha em sonho e visão, e não da interpretação do texto já registrado. Deus livrou os apóstolos e profetas de um “entendimento particular”, ou seja, de um entendimento carregado de imprecisões humanas, quando eles registraram a revelação recebida.” (CAMPOS, Eu Sou: Doutrina da Revelação Verbal, p. 201).

Em outro lugar da mesma obra, o autor acrescenta:

Os reformadores também romperam com a igreja de Roma em outro aspecto muito importante. Packer diz que os reformadores “entronizaram o Espírito no lugar da igreja como o autenticador e intérprete da Escritura”. A igreja de Roma sustentava para si mesma o direito de interpretar, de modo infalível, a Escritura, sendo a única depositária de toda a verdade. Contra isso, os reformadores se insurgiram. Não era a igreja que autenticava os livros da Escritura como inspirados. Não era o testimonium ecclesiae, mas o testemunho do Espírito que passou a ter primazia no protestantismo da Reforma. O Espírito passou a ter seu lugar devido, não só como originador, mas também como intérprete infalível da Escritura, na Teologia protestante. A prova dessa ênfase está no surgimento da doutrina do Testemunho Interno do Espírito Santo, levantada, desenvolvida e proclamada por Calvino. A Reforma trouxe, portanto, muitas mudanças e uma melhora sensível quanto ao papel do Espírito Santo e ao lugar da Escritura na Teologia, os quais resultaram na melhor formulação da doutrina da inspiração em comparação com a doutrina elaborada no catolicismo romano, embora não houvesse diferença fundamental entre ambas as tradições em relação à inspiração em si mesma.

Calvino ensina que o julgamento universal da Igreja para o reconhecimento da autoridade da Escritura é muito importante, mas a Igreja não empresta sua autoridade à Bíblia, nem estabelece sua origem divina. Não é a Igreja que determina se a Bíblia é fonte de autoridade; é ela própria que se autoautentica. E a convicção de toda a sua autoridade e, portanto, de sua confiabilidade vem do testemunho interno do Espírito Santo. Calvino nega veementemente que “a eterna e inviolável verdade de Deus tenha dependido da decisão dos homens”. Ao contrário, a igreja está construída “sobre o fundamento dos apóstolos e profetas”. Para ele, portanto, a Igreja não deu origem às Escrituras – as Escrituras é que geraram a Igreja. Assim, embora Calvino pudesse ver muitas provas da autoridade da Escritura, ensinou que “a persuasão deve ser procurada numa fonte mais alta do que as razões, os julgamentos ou as conjecturas humanas, ou seja, naquilo que vem do testemunho secreto do Espírito”.” (Ibidem, p. 221, grifo do autor).

Vem do trabalho do Espírito Santo a persuasão e a iluminação para o texto. Ou vem dele ou não existe compreensão.

Infográfico - O Papel do Espírito Santo na Leitura da Bíblia
Infográfico – O Papel do Espírito Santo na Leitura da Bíblia

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