Rebeca, esposa de Isaque, é estéril até ele chegar aos sessenta anos de idade (Gn 25.19-26). Assim, o nascimento de seus gêmeos deve ser considerado um nascimento sobrenatural, do mesmo modo que o de Isaque. Antes de nascerem, os dois lutavam no ventre da mãe, e Deus disse a Rebeca que eles seriam pais de duas nações, e o mais velho serviria ao mais novo. Esaú é o primeiro a nascer, mas logo fica claro que o outro, Jacó, é o escolhido por Deus. Novamente, a aliança da graça atua contra a escolha natural. É verdade que Esaú desprezou o seu direito de primogenitura na qualidade de o mais velho dos gêmeos, mas também é verdade que Jacó não é de jeito nenhum uma pessoa boa. Gênesis 27 fala detalhadamente da astúcia de Jacó para enganar o pai já fraco e quase cego. Ele engana Isaque para que este lhe dê a bênção pertencente ao primogênito.
Se há alguma dúvida de que Deus confirmará esse arranjo, ela logo se dissipa. Isaque invoca a bênção da aliança de Abraão sobre Jacó (28.3) e o envia para encontrar uma esposa entre os parentes na Mesopotâmia. Na saída da Terra Prometida, Deus fala a Jacó em um sonho e afirma que todas as promessas feitas a Abraão lhe dizem respeito (28.13-15). Jacó chama aquele lugar de Betel — “… casa de Deus…” (28.17). Ele então vai para Padã-Arã, na Mesopotâmia, e encontra sua prima Raquel. Ele deseja casarse com Raquel e trabalha para o pai dela durante sete anos. Labão, porém, lhe dá a filha mais velha, Leia, em vez de Raquel, e, por isso, Jacó precisa trabalhar mais sete anos por Raquel. Essa provação surge como mais um dos desafios ao cumprimento das promessas da aliança, embora talvez pareça uma punição justa para o homem que ludibriou o irmão para lhe tirar o direito de primogenitura. Contudo, Deus está com Jacó, que finalmente deixa de ser empregado de Labão e parte com as esposas e os filhos de volta para Canaã. Fica bem claro que a eleição de Jacó é pela graça, não por nenhum merecimento dele.
Ao voltar para Canaã, Jacó se prepara para o pior, já que teme a ira de seu irmão Esaú. Ele tem como defesa somente as promessas de Deus (32.9- 12). Porém, não é Esaú que ele encontra primeiro, e sim um homem cujo nome não se sabe e que por alguma razão começa a lutar com ele (32.22- 32). Jacó percebe que não se trata de um homem comum, mas, sim, de um mensageiro de Deus. Esse fato é envolto em certo mistério. Parece que o homem procura impedir o retorno de Jacó para a terra da promessa; contudo, quando ele põe fim à luta, Jacó se recusa a deixá-lo ir. Ele reconhece a origem divina, talvez até a natureza divina, de seu oponente. Tendo apenas as promessas de Deus por sustento, Jacó exige uma bênção antes de deixar o homem partir. Jacó recebe a bênção e, com ela, a mudança de nome para Israel, cujo significado diz que ele lutou com Deus. Só podemos pensar que isso foi uma espécie de experiência de conversão.
Desse momento em diante, Jacó passa a ser outro homem. Não é mais o enganador astucioso, mas o patriarca piedoso. Como uma possível confirmação disso, Esaú o recebe bem. Depois, Jacó se muda para Betel (onde Deus lhe apareceu pela primeira vez em um sonho), e ali o seu nome, Israel, é vinculado às promessas da aliança. Por isso, Deus é conhecido como o Deus de Abraão, Isaque e Jacó (35.9-15).
Até aqui, vimos que o princípio da eleição atua para destacar determinadas famílias de uma família maior. Abraão é escolhido como o pai do povo da aliança, e não Ló. Os descendentes de Ló, originados de uma união incestuosa com suas duas filhas, são Moabe e Ben-Ami. As nações que surgem disso, os moabitas e os amonitas, são, portanto, parentes de Israel e foram protegidos dos israelitas quando mais tarde estes avançaram para tomar posse da Terra Prometida (Dt 2.9,19). Dos descendentes de Abraão, a aliança diz respeito a Isaque, o filho de Sara, e não a Ismael, o filho de Agar. Dos descendentes de Isaque, Jacó, e não Esaú, é quem recebe as promessas da aliança. Esaú é Edom, e os seus descendentes também são protegidos de Israel (Dt 2.4,5). De diferentes maneiras, esses irmãos não eleitos, especialmente Edom, entram vez ou outra em conflito com Israel.
Depois que chegamos a Jacó e sua família, o processo de eleição se mantém fortemente com os seus descendentes. Israel é a nação eleita, mas a revelação posterior vai mostrar que essa eleição exterior prossegue lado a lado com a eleição interior para a vida eterna. Nem todo o Israel é Israel, o apóstolo Paulo mais tarde concluirá (Rm 9.6). O tratamento de Deus com a nação como um todo terá de se diferenciar de seu tratamento com os indivíduos quanto a sua salvação eterna. Esses dois aspectos da eleição também vão se distinguir da eleição de determinados indivíduos representativos, que são o alvo dos propósitos de Deus de um modo especial.
• Os princípios da aliança continuam se manifestando em Jacó. Pela eleição da graça, ele se torna o descendente de Abraão por meio de Isaque, a quem se dirigem as promessas de Deus.
—- Retirado de Graeme Goldsworthy – Introdução à teologia bíblica
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