O livro começa com a afirmação de uma doutrina muito cara a todos os profetas, ou seja, o amor incondicional de Yahweh por Israel(1.1-5), um tema cuja origem remonta a Deuteronômio 7. Esse amor incondicional manifestou-se na eleição de Jacó em vez de Esaú, e também na dispersão irreversível dos edomitas, em contraste com a obra soberana de Deus que trouxe os israelitas de volta de seu exílio na Babilônia. Apesar das persistentes dúvidas quanto à fidelidade de Deus, tudo que Israel devia fazer era olhar a sua volta para ver a diferença com que Yahweh os tratava, quando comparados às outras nações.
A segunda disputa (1.6–2.9), centralizada na falta de respeito de Israel por Yahweh como seu Pai e Senhor, foi demonstrada por seu desprezo pelos sacrifícios adequados exigidos pela legislação deuteronômica (cf. Dt 14.21). Os sacerdotes são criticados por sua frouxidão moral, ao receber como oferta a Deus aquilo que nenhum senhor humano teria aceitado. A intensidade do problema é trazida a público por uma comparação entre a adoração impura e relutante de Israel e a adoração pura a ser oferecida entre os gentios (1.11). Este conceito é um ponto exegético crucial no livro, já que estudiosos liberais indicam que o versículo 11 estabelece Malaquias como universalista, e defensores de um inclusivismo soteriológico usam o versículo para defender seu ponto de vista. Nenhuma das duas propostas corresponde às acusações do profeta contra casamentos inter-raciais, ou à apresentação de Elias, o maior destruidor de ídolos e o arquétipo de um exclusivismo religioso (cf, C. H. Bullock, An Introduction to the Old Testament Prophetic Books [Uma introdução aos livros proféticos do Antigo Testamento], p. 340). Esse versículo pode sugerir um contraste entre a adoração oferecida entre as nações pelos judeus exilados em suas sinagogas, ou, mais provavelmente, a adoração escatológica dos gentios convertidos a Yahweh.
A função dos sacerdotes levitas como professores e protetores dos valores espirituais de Israel é o outro lado dessa disputa. Os ideais deuteronômicos para os levitas (cf. Dt 14.23; 33.10) foram grosseiramente violados e aquela geração sacerdotal seria envergonhada diante do povo ao qual fora chamada a servir e cujos pecados eles não apenas tinham ignorado mas até encorajado (cf. o papel negativo de Eliasibe no livro de Neemias). A terceira disputa (2.10-16) diz respeito ao duplo pecado de desconsideração pela singularidade de Yahweh (primeiro mandamento) demonstrado nos casamentos com adeptos dos cultos pagãos e na infidelidade conjugal (sétimo mandamento). Dessa maneira, não apenas a realidade do relacionamento singular de Yahweh com Israel se diluía, mas sua imagem terrena de casamento monogâmico e indissolúvel também era destruída. Em termos explícitos (2.16), Malaquias expressa a visão divina do divórcio e previne contra o que subjaz à dissolução do casamento: a infidelidade espiritual. A quarta disputa (2.17–3.6) lida com o cinismo social de Israel. Na expectativa de que o próprio Deus demonstrasse seu tipo de justiça, a nação adotara uma postura ética perversa, baseada na premissa errada de que Yahweh não se importava mais com a justiça e de que o bem e o mal eram para Ele a mesma coisa (2.17b). O desejo por justiça se provaria mais do que Israel poderia suportar, pois Deus iniciaria o julgamento entre Seu povo mandando um mensageiro escatológico que prepararia o caminho para o aparecimento de Yahweh no meio de Seu povo. Malaquias, portanto, fornece o outro lado da moeda da presença de Yahweh. Este pensamento jubiloso, encontrado em Isaías 7–11 e Ezequiel 48, também tinha seu lado sombrio, pois o júbilo seria precedido de julgamento (3.5). O versículo 3.6 é, na verdade, uma dobradiça literária, afirmando a imutável justiça de Deus como a única razão pela qual Israel ainda não fora eliminado da terra.
A quinta disputa (3.7-12) trata da frouxidão religiosa de Israel. O diagnóstico divino é trágico, mas não é novo; os judeus do tempo de Malaquias demonstravam a mesma displicência que seus antepassados quanto à religião verdadeira. Para eles, uma crise era tempo de se apegar ao pouco que tinham, ao passo que Deus queria a entrega daquele pouco para que recebessem Dele em abundância (3.10). A não ser que a nação se dispusesse a fazê-lo, a maldição que eles mesmos haviam invocado permaneceria sobre eles (cf. Ne 10.28,29, 35-39). A sexta e última disputa (3.13-15), mais uma vez, trata da abordagem cínica de Israel para com a vida, questionando desta vez a necessidade ou proveito da religião, da adoração a Yahweh. Essa passagem é um quadro sombrio da vida quando a confiança em Deus é trocada pela dúvida na existência e valor da religião verdadeira, obediência e esperança em uma recompensa justa da parte de Deus. Depois, o materialismo decadente se instala. A resposta divina parece a este autor constituir uma seção separada da disputa (3.16– 4.6). O futuro ainda provaria que há valor em servir a Yahweh e manter uma religião verdadeira. Mesmo aqueles da geração de Malaquias que não haviam se curvado ao ceticismo cínico da época seriam recompensados com um relacionamento íntimo com Yahweh (3.17) e escapariam ao julgamento abrasador que varreria a maioria incrédula (4.1-3).
A exortação para que se lembrassem ―da lei‖ parece indicar que Israel deveria voltar à lealdade à aliança enquanto, como comunidade verdadeiramente adoradora, esperava a manifestação do mensageiro de Deus diante do escatológico Dia do Senhor (4.4-6). Malaquias parece sugerir que o dia já se aproximava, que o cenário estava pronto e que o futuro continha tanto a oportunidade para arrependimento e restauração, quanto a possibilidade de rebelião e rejeição, o que traria maldição, uma palavra assustadora que indicava as ameaças de invasão, fome, doença e exílio contidas em Deuteronômio 28– 30. De outro lado, por meio dessa menção à lei, Malaquias enfeixa sua profecia com os temas de amor (1.2s.) e obediência (4.1s.), partes essenciais da mensagem bíblica.