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A ANSIEDADE POLÍTICA

a ansiedade política

Você compreende qual é o papel da Igreja na sociedade? E mais do que isso, você compreende qual é o seu papel específico?
Permita-me, brevemente, lembrá-lo de coisas que você já sabe antes de continuarmos. Tenha um pouco de paciência.

Santo & Secular

A partir da descida do Espírito Santo sobre a Igreja, os cristãos passaram a ser habitados e capacitados por Ele. Muitos anos depois, vemos Paulo afirmar que todos fomos selados com o Espírito (2Co 1:22, 12:13; Ef 1:1; Ef 4:30). Além de Paulo, João também diz que o Espírito passou a habitar em todos os cristãos, sem exceção (1Jo 2:20,27; 4:13).

O pastor não é como o sacerdote do Antigo Testamento (AT) que, sozinho, representava o povo diante de Deus, como um mediador. Essa função agora é feita por Jesus. Através de Jesus, todos nós temos os mesmos privilégios do sumo sacerdote do AT, o único que podia entrar no Santo dos Santos (Hb 10:19-22). Em outras palavras, a função de cada membro do corpo de Cristo deve ser entendida a partir do ministério de Cristo. Nós somos uma comunidade profética e também sacerdotal, por causa de Cristo.

O que antes era função reservada à classe dos sacerdotes, hoje é dever de todo membro do corpo de Cristo. Todos nós somos convocados para um mesmo serviço fundamental: tendo sido reconciliados com Deus pelo nosso único mediador/sacerdote, que é Cristo, somos responsáveis por oferecer “a Deus, sempre, sacrifício de louvor, que é o fruto de lábios que confessam o seu nome” (Hb 13:15).

Tendo em vista que todos nós recebemos uma função sacerdotal, precisamos entender como isso funciona no dia a dia.
Todos os cristãos têm todos os benefícios de Cristo, incluindo o acesso ao Pai por intermédio dele. Cada cristão pode fazer tudo aquilo que os sacerdotes faziam: interceder por seus irmãos, ajudar com conselhos e instrução na Palavra, pregar a Palavra, chegar-se diretamente a Deus por meio de Cristo e oferecer sacrifícios espirituais a Deus (como orações e louvor). E não para por aí.

O Espírito Santo não é algo que vamos buscar dentro da igreja e deixamos lá quando vamos embora, mas alguém que está conosco santificando nossa casa, nosso casamento, nosso trabalho, nosso lazer e tudo o mais que fazemos.
Pense nisto: se nós entendemos que toda a existência é uma realidade de Deus – faz parte da sua criação – então, a separação “santo” e “secular” deixa de fazer sentido. Para o cristão, não existe “vida secular”, pois todas as áreas da sua vida glorificam a Deus.
Para o cristão bíblico, a distinção entre santo e secular não está correta porque não existe nenhuma área de nossa vida que seja secular. Toda a nossa vida é para Deus, em tudo que fazemos (Tt 1:15; Rm 12:1; 1Co 10:31).

Cristãos coerentes não têm uma vida de fé e outra vida pública. A nossa vida pública é a nossa fé em ação.
Para o cristão maduro, consciente de Cristo e de sua Palavra, o mundo é sagrado, pois é o mundo de Deus. Da mesma forma, as atividades culturais são sagradas, o lazer, o trabalho e o sexo são sagrados, e todas as demais áreas da existência, pois todas são para a glória de Deus, “pois dele, por ele e para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre! Amém” (Rm 11:36).

Não existe “arte secular”, “trabalho secular” ou qualquer outra coisa nesse sentido, apesar de qualquer dessas coisas poder ser feita de forma que desagrade a Deus e até blasfeme contra o seu santo nome. Todavia, não é necessário “cristianizar” as coisas para torná-las legítimas. Por exemplo: colocar um versículo em um cartão de visita não irá torná-lo um “cartão cristão” ou agradar mais a Deus; não é assim que se cumpre a missão cristã; não que isso seja errado ou proibido, mas o fato é que as coisas não serão santificadas misturando-as com elementos cristãos. Elas serão santas se forem feitas com gratidão a Deus, dando glória somente a Ele por tudo, e em serviço ao próximo.

Pois bem, talvez você já soubesse disso. Mas, agora, eu quero demonstrar de que forma muitos cristãos têm ignorado tudo isso.

A Secularização

Você já ouviu falar de “secularização”?
O assunto pode parecer teórico demais, mas não é complexo.
Veja: se “secular” é tudo aquilo que está fora do âmbito religioso, secularizar é afastar da vida comum o que é religioso.

Historicamente, a secularização tem a ver com o espaço que a fé supostamente deveria ocupar na vida social. Ou seja, é o processo de diminuição da influência religiosa na vida cotidiana que começou a florescer na transição da Idade Média para a Idade Moderna. A partir dessa época, surgiu a ideia de que, por causa dos avanços da ciência e da filosofia, dentre outras coisas, a religião não tinha mais sentido e deveria ser relegada à vida privada das pessoas.
A previsão era que a fé cada vez mais teria menos espaço para expressões públicas, até que a religião minguasse e desaparecesse da vida das pessoas. Mas não foi isso o que aconteceu. Ao contrário, vemos dia após dia a quantidade de religiões, templos e adeptos aumentando ao redor do mundo, ao ponto de muitos estudiosos estarem chamando este período de “a revanche do sagrado”.

Porém, a secularização não se restringiu apenas a um palpite ou uma previsão, mas se tornou também uma sugestão e até uma pressão contra a religião; um movimento cultural que pretendia que a opinião religiosa se tornasse cada vez mais apenas uma questão de foro íntimo e privado, deixando de exercer qualquer influência no debate público. Para essas pessoas, ninguém pode usar a fé para fazer uma leitura adequada da realidade e, portanto, não deveria usá-la na hora de reivindicar direitos ou sugerir pautas políticas.

Aceitava-se que as reivindicações públicas dos cristãos fossem feitas a partir de fatores pessoais, posições políticas ou mesmo pela cultura, mas jamais pela fé. Com isso, houve um esvaziamento religioso da organização da sociedade que, antes, acontecia justamente a partir do temor a Deus e do relacionamento com Ele. Em outras palavras, as decisões da sociedade deixaram de ser pautadas pela percepção religiosa.

Num primeiro momento, isso fez com que os cristãos fossem se distanciando pouco a pouco das decisões sociais. E foi assim que a secularização acabou triunfando, mas de um jeito diferente: está claro que a religião não irá acabar, mas já não há mais preocupação quanto às pessoas terem ou não religião, contanto que elas guardem suas convicções para si mesmas.

Ao longo dos anos, de lá para cá, houve muitos desdobramentos e mudanças nessas ideias, mas não se pode negar que a secularização faz parte da construção da sociedade atual.

As Reações

Hoje, com o processo de secularização já formado e normalizado, as reações de cristãos mal instruídos têm sido de se deixarem dominar pela ideia secularista ou de combatê-la a todo custo.

De um lado, como consequência de não perceberem o que está acontecendo, cristãos secularizados vivem um tipo de ateísmo prático: o Deus em que acreditam não os afeta no mundo real. Na igreja, eles acreditam no Deus das Escrituras, que governa o Universo e dita as questões morais, mas fora dela, apostam muito mais na autonomia e na liberdade humana; jogam o jogo político do secularismo. Vamos chamar essas pessoas de “secularizadas”. Quando os secularizados categorizam as coisas fora da igreja como “seculares”, de certa forma, já estão entrando no jogo e pensando como os secularistas.

Do outro lado, aqueles que se manifestam o fazem sem uma boa teologia pública, piorando muito toda a situação. Vamos chamar essas pessoas de “militantes”. Num primeiro momento, eles estão certos ao entender que não faz sentido exigir que, em questões públicas, os cristãos “engavetem” sua fé e assumam um discurso neutro. Em primeiro lugar, porque não existe discurso neutro. Isso é mito; uma ideia contraditória e também hipócrita.

Quando alguém diz que o debate sobre questões sociais deve acontecer deixando de lado a fé, essa pessoa já está desqualificando a posição religiosa desde o início. E isso não é feito por lógica, mas com critérios arbitrários. Isso é apenas impor suas crenças e opiniões particulares, não é ser neutro de forma alguma.
Os cristãos sentem que a proposta secularista não é antirreligiosa de verdade; ela é somente anticristã. Aliás, não é à toa que tão nitidamente a militância política tenha um fervor tipicamente religioso. Esse é um motivo muito forte para que os cristãos se posicionem não como cidadãos “neutros”, mas propriamente como cristãos.

Ainda que nós possamos questionar a qualidade da fé e da prática do povo brasileiro de modo geral, uma coisa é fato: o Brasil é majoritariamente cristão, E ainda que o Brasil seja um estado laico, o povo brasileiro não é. Por isso, o mínimo que se deveria esperar é uma grande manifestação pública da fé cristã.
Contudo, nós chegamos num ponto em que precisamos não meramente nos intrometer nos debates públicos sobre questões sociais, mas precisamos aprender a pensar a nossa fé em termos de uma “teologia pública”, pois é necessário reestabelecermos o diálogo antes de tentar trazer de volta a vida da fé à arena pública. O motivo disso é que, infelizmente, muitos cristãos interessados em assuntos políticos têm entrado totalmente despreparados nesses debates; eles constantemente defendem coisas sem sentido e de maneiras tão absurdas que não poderíamos esperar outra reação dos não cristãos que não fosse uma total rejeição.

Não temos dúvidas: a fé é mais importante que a política para o desenvolvimento pessoal e da própria sociedade.

No entanto, não é possível demonstrar isso sem que antes haja muito mais reflexão por parte dos cristãos sobre os temas de debate político antes de qualquer manifestação de sua parte. É óbvio que, para isso, precisamos pensar sobre pautas sociais muito mais do que apenas no período anterior a cada eleição, e para muito além de respostas a postagens anticristãs nas redes sociais.

Se, por um lado, o mínimo que se espera de um país majoritariamente cristão é um posicionamento público à luz da fé, o mínimo que se espera de cristãos que se aventurem na exposição pública de ideias é que conheçam acima da média sobre os assuntos que pretendem discutir.

Graças a Deus, no meio de tanto discurso público envergonhando a fé cristã, há pessoas se dedicando a fazê-lo com temor. porque compreenderam que é importante e urgente se posicionar – e tal como Jesus ensinou, sem depender da imposição estatal.

Leia muito, mas muito mais sobre isso no livro A Política e a Fé Cristã, no link abaixo:

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