É fato que Deus ordenou sua Igreja a eleger pastores, mas pastores tementes a Deus.
“Aos presbíteros que há entre vocês, eu, presbítero como eles, testemunha dos sofrimentos de Cristo e, ainda, coparticipante da glória que há de ser revelada, peço que pastoreiem o rebanho de Deus que há entre vocês, não por obrigação, mas espontaneamente, como Deus quer; não por ganância, mas de boa vontade; não como dominadores dos que lhes foram confiados, mas sendo exemplos para o rebanho. E, quando o Supremo Pastor se manifestar, vocês receberão a coroa da glória, que nunca perde o seu brilho” (1 Pedro 5:1-4)
No artigo anterior, lembrei o cancelamento da anual premiação da Faculdade Teológica da Universidade de Princeton, em 2017, quando o indicado do ano ao prêmio Abraham Kuyper de Excelência em Teologia Reformada e Vida Pública era o pastor da cidade de Nova York, Timothy Keller. E, ironicamente, Keller deixou de receber um prêmio em teologia reformada e vida pública em razão de suas convicções teológicas publicamente conhecidas.
Agora, diante das carências por parte dos pastores e teólogos, bem como das demandas da igreja, tanto nos Estados Unidos e, especificamente, no caso brasileiro, saúdo a publicação de Becoming a Pastor Theologian [Tornando-se um Pastor Teólogo, Editora Ultimato, no prelo]. Nada mais urgente do que a redescoberta da Teologia como a diferença específica na identidade dos pastores e líderes da igreja. A maior crise que esses líderes enfrentam hoje é de identidade. Homens e mulheres à frente de trabalhos das comunidades cristãs simplesmente não sabem o que devem fazer, o que se espera deles e nem com o que comparar seu trabalho. E uma das reações mais normais a essa crise é a busca de parâmetros na cultura da profissionalização que os cerca.
Através de comparações com administradores, terapeutas, coachs e intelectuais públicos diversos, as lideranças cristãs procuram justificar a relevância dos seus ministérios. E não podemos deixar a culpa desse processo de degeneração da vocação pastoral recair apenas sobre os ombros de alguns, como se fosse um erro só dos pastores e líderes. As igrejas hoje estão cada vez mais exigentes, esperando de seus obreiros habilidades gerenciais, terapêuticas e até mesmo de entretenimento — e se os pastores tiverem um MBA, melhor ainda!
Não podemos imaginar como isso gera, por um lado, uma frustração terrível nos pastores, por outro lado o desinteresse teológico das lideranças leigas da comunidade e, por fim, um fatal envenenamento da Igreja como um todo. Hoje, mais do que nunca, é necessário lembrar aos nossos irmãos que nós não somos profissionais, como dizia John Piper. Não há nada de errado com eles, mas o vocabulário da profissionalização não consegue traduzir o trabalho para qual fomos vocacionados.
O serviço de um pastor ou líder da igreja sempre será TEOLÓGICO. E a maior contribuição que esse lançamento da Editora Ultimato traz é justamente nos lembrar disso através da boca instruída de homens como Kevin Vanhoozer, James K. A. Smith, Peter Leithart, dentre outros coautores da obra. Seja em ministérios femininos, de juventude, profissionais ou entre estudantes, nós só contribuímos com a igreja quando compartilhamos a Palavra de Deus em formulações doutrinárias que contribuam para os discípulos de Cristo viverem bem diante de Deus!
Não deixe reduzirem seu chamado a uma agenda de eventos e espetacularização dos grupos sociais da igreja. Não fomos chamados para organizar chás com as senhoras, louvorzão com os jovens e churrasco com os homens! A anemia teológica que a igreja evangélica brasileira vive é uma consequência natural da busca ingênua que os seus líderes insistem com os valores e parâmetros administrativos e terapêuticos — que nunca conseguiram acrescentar relevância a um ofício que, por natureza, precisa ser teológico! Em um tempo que os pastores do rebanho de Cristo sofrem de uma crise de identidade terrível — não sabendo ao certo se são administradores da máquina eclesiástica, se são terapeutas de carências afetivas das ovelhas ou até mesmo animadores de auditórios nos fins de semana —, a identidade dos “pastores que também são mestres” (conforme uma boa tradução de Ef 4.11) surge não apenas como um corretivo para tais ênfases viciadas do ministério pastoral, como também uma saída para a crise que acomete tantos pastores.
Que Deus nos dê mais intelectuais como Keller que não se calarão para ganhar uma medalha de honra às modinhas do espírito do tempo.