Você já parou para pensar que as coisas que você acredita são determinantes para a forma que você interpreta e aplica o texto bíblico? Isso pode parecer óbvio para alguns (mesmo sem saberem qual é o resultado disso) e estranho para outros, mas não, não é possível ler a Bíblia de forma “neutra”. Você nunca fez isso e nunca fará. Então, faz muita diferença você entender quais são os pressupostos que está usando na leitura e que diferença eles estão fazendo no fim das contas. Abaixo, um trecho do livro Introdução à Hermenêutica Reformada, de Paulo Anglada (Knox, 2006, p. 109-110):
Representantes das mais variadas correntes hermenêuticas e teológicas reconhecem a impossibilidade de total objetividade na pesquisa histórica de modo geral, e na exegese em particular. Ninguém precisa compartilhar da concepção metafísica subjetivista de Gadamer, por exemplo, para concordar com ele quando afirma que “nem mesmo um mestre do método histórico é capaz de permanecer completamente livre dos preconceitos do seu tempo, do seu ambiente social, da sua posição nacional, etc”. Nem é preciso subscrever a nova hermenêutica existencialista para admitir que Bultmann está certo ao enfatizar que a exegese sem pressuposição é impossível, visto que o entendimento depende sempre de uma pré-compreensão do assunto.
Eruditos conservadores reconhecem o fato. Dwing Poggemiller considera que “a objetividade geralmente enfatiza como o alvo final do estudo, se realmente alcançada, em última instância nos alienaria do mundo, nos deixando sem possibilidade de nos relacionar com os dados que estivéssemos investigando”, e que “na realidade, portanto, pressuposições não deveriam ser vistas como um impedimento para a interpretação, e sim como um auxílio para um melhor entendimento sobre como conduzir a prática hermenêutica”. Graham Stanton observa que “a tentativa de interpretar o NT de um ponto de vista neutro e isento e com métodos considerados estritamente científicos tem sido amplamente abandonada. No auge da sua popularidade, esse enfoque tinha suas próprias pressuposições compartilhadas por muitos: aquelas do liberalismo clássico”. Exegese isenta de pressuposição já foi chamada de “Princípio da Cabeça Vazia, visto que quanto menos alguém souber, melhor exegeta será”.
Além disso, é preciso distinguir entre pressuposições e preconceitos ou prevenções. Os preconceitos, decorrentes das próprias idiossincrasias ou preferências pessoais do intérprete são uma coisa – e representam um perigo real na interpretação das Escrituras, porque são mais ou menos inconscientes e difíceis de serem reconhecidos. As pressuposições, entretanto, são pontos de partida filosóficos, ideológicos ou religiosos reconhecidos e inevitáveis. O importante é que o intérprete reconheça a impossibilidade dessa pretensa objetividade e seja precavido para não impor suas pressuposições ao texto. Ao invés disso, ele precisa permitir que suas pressuposições sejam julgadas e avaliadas pelo texto. É a Bíblia que deve ser o juiz das pressuposições, e não o contrário. O que se deve avaliar é a veracidade das pressuposições de acordo com as evidências das próprias Escrituras.
As pressuposições confessionais reformadas são formulações teológicas bíblicas e representam a compreensão histórica de tópicos fundamentais, direta ou indiretamente relacionados à interpretação das Escrituras. Elas não são mero produto da razão, da tradição ou da revelação natural. Antes, representam o ensino das próprias Escrituras, conforme entendido historicamente pela fé reformada.
Para os intérpretes reformados, portanto, as pressuposições teológicas são, não apenas permitidas, mas necessárias e imprescindíveis. Para eles, o problema não está na legitimidade ou ilegitimidade das pressuposições reformadas. Está, sim, na incredulidade daqueles que não se deixam convencer pela própria revelação bíblica com relação à sua natureza divina.
No infográfico abaixo, vemos alguns grupos de pressupostos fundamentais na hermenêutica bíblica fiel.
